Vietnã: cicatrizes da Guerra
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Vietnã: cicatrizes da Guerra

Quarenta anos após o fim da Guerra do Vietnã, é impossível visitar o país sem mergulhar na história do que aconteceu durante esse período.  A Guerra do Vietnã aconteceu nos territórios do Vietnã do Norte, Vietnã do Sul, Camboja e Laos, entre os anos de 1959 e 1975, e é tido como o conflito armado mais violento que aconteceu na segunda metade do século XX. 

Acerca de 70km de Ho Chi Minh, antiga Saigon, fomos conhecer os túneis de Cu Chi, utilizados durante a Guerra. São 250 km de túneis somente nesta área. Há outros complexos de túneis como este espalhados pelo país. Foi muito interessante visitar o lugar e conhecer as táticas utilizadas pelos vietnamitas para vencer a guerra contra os EUA.  

Enquanto os americanos investiam em bombas e misséis, os guerrilheiros comunistas, chamados de vietcongues, ganhavam vantagem por utilizar seu território, desconhecido pelo seu adversário, como sua melhor forma de defesa.

De forma muito inteligente e tática, faziam armadilhas por toda a floresta. Além disso, estavam acostumados a lidar com as altas temperatura, o clima tropical e eram pequenos suficientes para circular facilmente nestes túneis.  

Já a nossa experiência nos túneis foi um pouco clastrofóbica. Nós andamos somente 50 metros dentro dos túneis e foi sufiente para ter uma ideia do que eles viveram naquela época. As passagens são muito estreitas, sendo que em alguns momentos tivemos que engatinhar para conseguir passar. Pessoas muito altas tem que rastejar para conseguir passar.

Alguns trechos do túnel eram escuros e a sensação é horrível. Fico imaginando naquela época, que devia ser bem pior. Segundo nosso guia, alguns trechos do túnel foram expandidos para permitir a visitação de estrangeiros, porque durante a guerra eram ainda mais estreitos.

Os vietcongues possuíam vantagem por conhecer cada centímetro do local onde estavam guerrilhando. Enquanto os EUA utilizavam de armamentos modernos e helicópteros, os vietcongues faziam usos de táticas de guerrilha que só eles dominavam.

Já que a principal “arma” dos vietcongues era o seu território, os EUA resolveram atacar da forma mais covarde possível. Entre 1961 a 1971, foram despejados cerca de 80 milhões de litros de herbicidas e desfolhantes sobre o Vietnã do Sul. O objetivo era destruir as safras do inimigo e dizimar as selvas em que se escondiam os vietcongues e o Exército do Vietnã do Norte.

Cerca de 16% do território do país foi bombardeado com toxinas. Entre elas, a mais utilizada era a dioxina, apelidada agente laranja. Uma substância altamente tóxica, que causa doenças graves como câncer de pulmão, câncer de pele, incapacidade mental, deformidades no organismo e abortos.

Seu efeito em florestas pode durar por até duas gerações, comprometendo a fauna e a flora, bem como a contaminação do solo e das águas. As consequências do chamado agente laranja são visíveis até hoje. São mais de 3 gerações que ainda podem sofrer as consequencias do agente laranja, sem contar os problemas sociais causados em decorrência disso.

Segundo reportagem da Revista Carta Capital (maio 2015), há exatos 40 anos após o fim da guerra que, calcula-se, matou 3 milhões de pessoas, as questões relativas à potência e alcance dessa substância tóxica seguem em aberto e são cada vez mais difíceis de responder à medida que nascem no Vietnã uma segunda e, agora, uma terceira geração de crianças apresentando alta incidência de deficiências, como síndrome de Down, paralisia cerebral e desfiguração facial extrema.

Depois do passeio nos túneis, fomos ao Museu da Guerra, na cidade de Ho Chi Minh, e vimos fotos de perder o folêgo e arrancar lágrimas. Muitos foram os fotógrafos guerreiros que arriscaram suas vidas para registrar o que acontecia nos campos de batalha. São várias as fotos que venceram o Prêmio Pultizer, mostrando ao mundo o que estava ocorrendo. A sala com fotos das consequências do agente laranja são chocantes e abalam. Era comum ver as pessoas saindo emocionadas desta sala.

Tudo isso me fez pensar como o ser humano pode ser tão cruel, movido por valores que nem sempre ele acredita, mas que é forçado pela sociedade em “defesa” de seu país.

O Vietnã é um país fantástico de se conhecer, tem lugares incríveis para serem visitados, seu povo é simpático e hospitaleiro, mas, é impossível não se deparar com as consequências da guerra para entender os problemas sociais advindos dela.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, o Vietnã é um dos países com maior índice de pessoas com deficiência no mundo. Em 2009, o censo apontava que cerca de 8% da população tinha algum tipo de deficiencia, mas estátisticas mais recentes apontaram que tal porcentagem é de 15%.

A OIT (Organização Internacional do Trabalho) aponta as dificuldades que pessoas doentes ou com algum tipo deficiência têm em encontrar emprego no país. Das quase 7 milhões de pessoas com alguma deficiência no país, uma parcela pequena consegue emprego fixo no Vietnã. O motivo apontado pela OIT é comum em outras partes do mundo, causado pela discriminação e a percepção errônea de que esses trabalhadores são incapazes de realizar suas funções no mercado de trabalho.

Já que é difícil arrumar um emprego fixo, muitas pessoas com deficiência resolveram se dedicar ao bordado e artesanado, se engajando em projetos sociais voltados para a venda destes produtos no mercado de turismo, que vem movimentando cada vez mais a economia do país.

Nos pequenos passeios que fizemos, viajando de uma cidade para outra, era comum os ônibus pararem em grandes lojas, onde víamos pessoas com deficiência fazendo na hora os bordados à venda.

A boa notícia é que organizações como UNICEF, USAID e OIT vêm trabalhando em conjunto com o Governo do Vietnã para promover uma sociedade mais inclusiva, atendendo os requerimentos da Convenção da ONU para os Direitos de Pessoas com Deficiências (UN Convention on the Rights of Persons with Disabilities). O objetivo é a conscientização da população e a criação de mecanismos de incentivo, por meio de leis, visando treinamento, emprego, educação e assistência médica para pessoas com deficiência.

Como se tivesse sido uma briguinha de casal, segundo artigo publicado recentemente na BBC, os EUA e Vietnã normalizaram suas relações em 1995, e anunciaram um acordo amplo em 2013. O comércio bilateral movimentou quase US$ 35 bilhões em 2014.

Agora eu pergunto: até quando o ser humano vai continuar colocando seus interesses políticos em primeiro plano, pouco se importando para o real valor da vida?!

 

Referências

http://carreiras.folha.blog.uol.com.br/arch2011-05-15_2011-05-21.html
http://www.cartacapital.com.br/internacional/agente-laranja-o-legado-fatidico-dos-eua-no-vietna-1631.html
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/04/150430_vietna_guerra_fatos_pai
http://vietnam.angloinfo.com/healthcare/people-with-disabilities/
Peoples with disabilities in Viet Nam – UNFPA (United Nations Population Fund) -  Dezembro de 2011

 

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