Soe Lay e o futuro craque de Mianmar
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In Ásia

Soe Lay e o futuro craque de Mianmar

Estávamos procurando um lugar para jantar quando um simples “olá” transformou nossos dias na pequena cidade de Bagan, em Mianmar. Soe Lay e sua família estavam caminhando, quando sua filha mais velha sorriu para o Mau e ele retribuiu o sorriso. Assim, eles pararam para nos cumprimentar e, curiosos, perguntaram de onde éramos.

 

Quando falamos que éramos brasileiros, Soe Lay ficou todo empolgado, pois adora futebol e disse que seu filho pequeno seria um grande craque no futuro. Depois de algum tempo conversando, ele nos convidou para conhecer sua vila, mas já era tarde e dissemos que ficaria para outro dia.

No dia seguinte, estávamos passeando de moto pela cidade e, no final da tarde, resolvemos ir explorar a região que encontramos Soe Lay na noite anterior. Mal chegamos na vila e ele gritou de longe, feliz por ver a gente. Imediatamente, nos convidou para irmos na sua casa.

Uma casa muito simples, feita de bamboo e fibras de folha de bananeira. Minha sensação foi de tanta fragilidade, que se fosse uma das casas dos três porquinhos, o lobo mal poderia assoprar, que facilmente a casa ia sair voando. Fiquei pensando como eles faziam quando chovia forte e, quando perguntamos, Soe Lay ainda nos mostrou onde eram as goteiras e onde os morcegos passavam pela noite, como se fosse algo muito natural.

A casa não tinha cômodos, mas apenas um espaço para guardar as coisas e uma escada de tábuas de madeira que levava ao local em que todos dormiam. Era um pequeno espaço feito de bamboo com uma esteira e um fino cobertor em cima. A casa tinha apenas uma janela, que ficava constantemente aberta pois não tinha nada para fechá-la ou cobri-la. Na parte de fora da casa, ficava um grande balde de água para tomar banho, e não tinha banheiro.

Soe Lay e sua esposa tem 3 filhos: uma menina de 6 anos, que toda empolgada queria mostrar para a gente o que tinha aprendido na escola; e 2 meninos, um pequeno de 6 meses e o futuro craque do futebol de Mianmar, Sow Johan, de apenas 2 anos e meio.

Soe Lay tem uma verdadeira paixão por futebol, mas quando era pequeno machucou o osso do dedão e sabia que nunca poderia jogar profissionalmente. Ele vê no pequeno Sow Johan o que ele não pode ser, e sonha com o dia que seu filho se tornará o craque não só de Mianmar, mas do mundo, porque será contratado pelo time do Manchester United. Todo empolgado, ele contava seus sonhos, que era ele assinando o contrato do filho e recebendo o cheque de 10 milhões de libras!

O jogador favorito de Soe Lay em Myanmar é o brasileiro Cezar, que joga no Yangon United Football Club. Como esse mundo é muito maluco e pequeno, cruzamos alguns dias atrás, antes de conhecer Soe Lay, com a Karina, mulher do jogador Cezar, que mora em Yangon. Ela estava com suas amigas, que também são esposas de jogadores de futebol brasileiros que jogam aqui em Mianmar. Elas estavam passeando e ao nos ouvir falando português, pararam para conversar e foram muito simpáticas.

Depois, Soe Lay nos contou como seriam os jogos do futuro “Tiger Sow Johan, o camisa 10”, como o chama, e dizia: “Quartas de final, disputa contra EUA: 8x0 para Mianmar, 4 gols de Sow Johan. Semi-final, disputa com a Colômbia: 7x0 para Mianmar, 5 gols do Sow Johan. Final contra Alemanha: 3x0 para Mianmar, 3 gols do Sow Johan.” E ai, perguntamos: “Mas e o jogo contra o Brasil?” Ele disse: “Esse, como eu gosto muito do Brasil, vai ser assim: 3x0 no primeiro tempo para o Brasil, mas, no segundo tempo, Mianmar empata e Sow Johan faz o gol da vitória aos 45 do segundo tempo.” E sua imaginação ia longe nestes momentos de felicidade, quando ele contava seus sonhos.

Enquanto isso, no mundo real, Soe Lay é um pescador que ganha menos de 3 dólares por dia. Ele trabalha para o dono do barco, junto com mais 2 pescadores. Trabalha todos os dias das cinco da manhã às três ou as cinco da tarde. Enquanto sua mulher vai lavar louça no monastério em troca de comida. A menina mais velha vai para a escola que é gratuita, oferecida pelo governo, e os meninos menores ficam com a mãe na maior parte do tempo.

Soe Lay não completou a escola, mas aprendeu muita coisa no monastério quando lá morou dos 16 aos 18 anos. Apesar de não falar inglês direito, ele sabe se comunicar muito bem. Disse que lia muito no monastério e assistia filmes americanos porque ele queria muito aprender a falar inglês.

Uma família simples, honesta e com tamanha hospitalidade nos deixou tão emocionados que decidimos ajudá-los de alguma forma. Em nenhum momento eles nos pediram nada, pelo contrário, nos ofereceram ajuda e perguntaram até se nós queríamos que eles lavassem nossas roupas, de graça!

Saímos de lá e fomos em um mercadinho ver o que poderíamos comprar para eles. Quando os conhecemos, a gente teve dificuldade de entender qual das crianças era menino e menina porque os meninos usavam roupas de menina, bem velhinhas e rasgadas, e todos tinham cabelos bem curtinhos porque é mais fácil de cuidar. Por isso, optamos por comprar roupas para as crianças e material escolar: cadernos e lápis. O Mau separou uma camisa do Brasil que ele tinha para o Soe Lay e eu separei algumas roupas minhas para sua esposa. A gente não tinha muita coisa nas nossas malas, mas queríamos muito ajudá-los.

No dia seguinte, fomos levar os presentes. Eles ficaram tão felizes com as coisas que levamos, que dava para ver o brilho nos olhos de cada um. A esposa de Soe Lay não falava inglês, mas não conseguia esconder o sorriso no rosto. Nos convidaram para almoçar e fizeram questão de oferecer o seu melhor peixe que, por sinal, estava delicioso. Eles não sabiam o que fazer para nos agradar, mal sabiam que quem estava ganhando o melhor presente de todos era a gente, por ter a oportunidade de ajudar, pelo menos um pouquinho, uma família como aquela.

Falei para Soe Lay que ia escrever sobre sua história e ele disse que ia dar um jeito de acessar a internet para ver a foto de sua família fazendo sucesso no Brasil, já que ele não pode viajar, porque não tem um documento de identidade. Seu bisavô era indiano, e por causa da cor de sua pele e formato do rosto, ele não pode tirar o documento em Mianmar, por causa dos conflitos religiosos. 

Aproveito para deixar aqui minha mensagem para ele:

Soe Lay, por mais difícil que a vida seja, nunca deixe de sonhar, pois nossos sonhos alimentam nossa esperança e aumentam nossa autoconfiança para lutar por aquilo que a gente acredita. Faça da sua simpatia e honestidade, suas maiores virtudes. Tomara que o pequeno craque Sow Johan, além de ser o Tiger camisa 10, faça a diferença nesse mundo e possa ajudar muitas outras famílias de Mianmar a terem uma vida melhor.

Soe Lay, despite of the difficulties that life may show to you, never stop dreaming, because our dreams can feed our hope and increase our self-confidence to fight for what we believe. Make your sympathy and honesty your greatest virtues. Hopefully the little soccer player Sow Johan, besides being “The Tiger, shirt number 10” , will make a difference in this world and will help many other families from Myanmar to have a better life.

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